21 de novembro de 2010

Vote! É um direito seu!

"Faz tempo que não escrevo. Mas tenho justificativa, estou (re)estudando para o vestibular (de novo?!?!). Agora para jornalismo. Estou estudando pacas mesmo. Depois de um tempo que passei sem estudar, só assistindo filmes e bebendo cerveja, fiquei com vontade de mudar geral, de novo. Tomara que eu passe. E digo mais: Tomara que, passando, não desista de novo."


Isso foi a um tempo, não sei como, ao tentar editar o texto, acabei apagando, mas voltando ao pc do meu irmão, peguei de volta o original. Escrevi o texto antes do Enem. Tinha minhas dúvidas quanto ao Enem, mas ao fazê-lo, tive uma boa surpresa.

Questões do Enem devem ser resolvidas em menos de 3 minutos em média. Mas um texto como esse, divulgado numa prova com uma abrangência nacional, pode fazer a pessoa mudar o pensamento pelo resto da vida. Ou não, né? Prefiro acreditar que sim.


Lembro muito bem que quando era criança que nunca gostei de ir à igreja. De família católica praticante, minha mãe me matriculou em um colégio católico. Toda quinta-feira havia um momento religioso, no qual os alunos assistiam à Adoração do Santíssimo Sacramento – letras maiúsculas para enfatizar a importância que aquilo tinha no colégio, e para mim mesmo, até hoje. Com o tempo, achei meio que bobo ficar toda semana repetindo maquinalmente o que havia feito na semana passada. A hora de cantar, levantar as mãos, se ajoelhar, agradecer por estar vivo, pedir para não ficar de recuperação, apostar corrido para ver quem chegava primeiro na sala de aula. Pra ser sincero, depois que fiquei maiorzinho, e percebi que as meninas não se importavam com quem chegava primeiro na sala, parei de sair correndo da igreja. Porra, era a parte mais emocionante da quinta feira. Há tarde tinha educação física.
Como tivesse parado de correr, comecei a me concentrar mais na Adoração. Pra ser sincero, foi nas manhãs quinta-feira que comecei a delinear meu pensamento sobre religião. Pois é, certa feita eu estava, como de costume, mais ou menos na sétima série, na igrejinha do colégio, de joelhos, mãos pro alto, e cantando junto com o coro ‘eu te amo’ para um ostensório, e de repente eu me perguntei: O que estou fazendo? Daí em diante comecei a me perguntar o porquê de ter que ir à adoração. Não me sentia mais à vontade naquela situação. E resolvi que era melhor não ir mais.

Certo dia fiquei no pátio esperando a hora de ir à aula quando o zelador me perguntou por que eu não estava na igreja. Hum-hum... quero ir não. Mandou-me ir à direção. O coordenador disse então que se não fosse imediatamente para a igreja eu seria suspenso. Mas eu não acredito nisso, essa coisa de igreja e religião... eu não concordo não... era melhor eu estar na sala de aula, ou lendo um livro, que é melhor que ficar de joelhos. E como assim eu era obrigado a ir à igreja, se nem crente mais eu era? Como um cara que não se identifica com aquilo poderia ser obrigado a ir comparecer aquilo? O coordenador colocou então os argumentos na mesa: Certo, você não é obrigado a ir para a adoração, mas se não for será suspenso. Passei a não freqüentar as aulas de religião quando a professora disse que Darwin estava errado porque deus não é macaco e se a teoria fosse certa, haveria macaco se transformando em homem e homem se transformando em macaco até hoje. Pra ser sincero, eu ficava muito puto. Aquilo não era, nem de longe, educação religiosa. Dizia eu, educação não pode ser confundida com doutrinação. Diziam, se tu Filipe, se não concorda, por que está nesse colégio? Depois de muito pedir meus pais para sair, e depois de vários anos de ocorrências e duas suspenções, uma quase expulsão, saí do colégio.
Você, leitor, acha isso justo? Ser obrigado a seguir um culto que não se identifica? E ser obrigado a isso?

Me excedo em todo texto que começo. O que era para ser a introdução virou uma confissão verborrágica, lamento, prometo ir logo ao assunto. Diziam que era direito meu não seguir nenhuma religião. Mas eu seria suspenso se não fosse à igreja. Meio contraditório, não? Um direito que só permite um via de escolha: a que é imposta.

Sempre me lembro da história de ser obrigado a ir ou não à igreja quando se aproximam esses períodos de eleição.


Eu perguntava, por que sou obrigado a acreditar nesse deus?
Até os 10 anos, a resposta era simples: Porque senão você não vai pro céu. Depois dos 10, por que você será suspenso.

Você pode se perguntar, por que sou obrigado a votar?
A resposta a esse questionamento parece simples: todos temos a obrigação de votar, porque a lei (CF/88, art. 14, § 1º.) exige e pune quem a descumprir. Então a questão deveria ser reformulada: por que fazer leis me obrigando a votar?

De antemão, devemos lembrar que a Constituição Federal foi elaborada por políticos (deputados e senadores), através da Assembléia Nacional Constituinte. Portanto, foram eles que imprimiram na Carta Maior a imposição do voto.

Aqui o link da parte de legislação no tocante ao processo eleitoral se você quiser lê-lo na íntegra:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L4737compilado.htm

Interessante que, mesmo a constituição vigente sendo a de 1988, o código eleitoral baseia-se no 5° Código Eleitoal Brasileiro, datado de 15 de julho de 1965 (o que o Brasil vivia nessa época mesmo, hein?), com algumas modificações feitas com o passar do tempo.
Se você lê-lo, poderá perceber , na primeira parte, do que trata dos eleitores, há mais artigos falando da punição para quem não vota, do que propriamente do processo eleitoral que a pessoa passa.
Ou seja, votar é um direito seu, e você, como cidadão, é amparado por uma lei que protege o seu direito ao voto. Ou seja:


Art. 2º Todo poder emana do povo e será exercido em seu nome, por mandatários escolhidos, direta e secretamente, dentre candidatos indicados por partidos políticos nacionais.

Art. 3º Qualquer cidadão pode pretender investidura em cargo eletivo, respeitadas as condições constitucionais e legais de elegibilidade e incompatibilidade.


Beleza. Assim, do jeito que tá, a lei é linda (liberdade, igualdade e fraternidade: Já podemos tomar a Bastilha!). Logo adiante, porém:


Art. 7º O eleitor que deixar de votar e não se justificar perante o juiz eleitoral até 30 (trinta) dias após a realização da eleição, incorrerá na multa de 3 (três) a 10 (dez) por cento sobre o salário-mínimo da região, imposta pelo juiz eleitoral e cobrada na forma prevista no art. 367. (Redação dada pela Lei nº 4.961, de 4.5.1966)

§ 1º Sem a prova de que votou na última eleição, pagou a respectiva multa ou de que se justificou devidamente, não poderá o eleitor:

I - inscrever-se em concurso ou prova para cargo ou função pública, investir-se ou empossar-se neles;

II - receber vencimentos, remuneração, salário ou proventos de função ou emprego público, autárquico ou para estatal, bem como fundações governamentais, empresas, institutos e sociedades de qualquer natureza, mantidas ou subvencionadas pelo governo ou que exerçam serviço público delegado, correspondentes ao segundo mês subsequente ao da eleição;

III - participar de concorrência pública ou administrativa da União, dos Estados, dos Territórios, do Distrito Federal ou dos Municípios, ou das respectivas autarquias;

IV - obter empréstimos nas autarquias, sociedades de economia mista, caixas econômicas federais ou estaduais, nos institutos e caixas de previdência social, bem como em qualquer estabelecimento de crédito mantido pelo governo, ou de cuja administração este participe, e com essas entidades celebrar contratos;

V - obter passaporte ou carteira de identidade;

VI - renovar matrícula em estabelecimento de ensino oficial ou fiscalizado pelo governo;

VII - praticar qualquer ato para o qual se exija quitação do serviço militar ou imposto de renda.

Engraçado. Falta só uma lei dizendo: se não concorda com o que está na constituição, então por que mora nesse país?

Mandando a real, pra mim, esse é só mais um exemplo de legislação em causa própria. Os Constituintes chegaram lá, e como o povo estava do lado de fora do congresso, escreveram uns parágrafos que obrigaria o povo a votar em algum deles. Eles sabiam que em algum momento a onda de democratização iria passar e todo aquele lance de “a primeira votação direta em mais de 15 anos” não duraria para sempre.

Algo meio parecido com que deus do meu colégio, quando criou a humanidade, e dar a ela o livre-arbítrio, pensou: Antes de dar livre-arbítrio a eles, é melhor dizer que, se não me colocarem acima de todas as coisas, eles vão para o inferno.

Então, ele disse que nos amava muito e por isso nos outorgou a primeira constituição. Com 10 artigos. Nada muito arrojado. Com o tempo, surgiram as primeiras faculdades de Direito, onde a humanidade aprendeu a achar brechas na lei. "E viu o SENHOR que a maldade do homem se multiplicara sobre a terra e que toda a imaginação dos pensamentos de seu coração era só má continuamente” (Gênesis 6) e decidiu eliminar a população provocando uma grande catástrofe. A grande catástrofe nasceu sobre o nome de Francisco Campos, ou Chico Ciência, jurista especializado em dar roupagem legal para medidas abusivas. É dele a autoria da Polaca de 1937 e dos Atos Institucionais de 1964 e 1965.

A única lei que devia valer, seria, pra mim, essa :
Art 1o - Amai-vos uns aos outros como eu vos amei
Art 2o - Revogam-se as disposições em contrário.
Esse papo de religião vai merecer um post só pra ele, e dos grandes, mas não agora

No congresso constituinte, os caras, vendo que se o voto não fosse obrigatório, haveria um número ínfimo de eleitores voluntários, perceberam que seria uma roubada não penalizar os não-votantes.
Aqui, na lei, e principalmente na propaganda estatal, o bom cidadão investiga o passado do candidato e estuda bem as propostas do cara. E o cara candidato também é cheio de boas intenções. Passado limpo e adora criancinhas.
Na real, isso de dar satisfação dá muito trabalho. "Vamos obrigar eles a votar e na hora a gente arruma um jeito deles votar na gente". Assim pensa um candidato, quebrando as pernas da frágil democracia brasileira e assassinando a gramática normativa portuguesa. Ai, ai.

Um dia desses, estava assistindo uma sabatina com um candidato ao governo aqui do estado.
Eis a pergunta do jornalista:

- Candidato, é notório que em época de eleição, as forças de segurança rodoviárias deixam de distribuir multas. As polícias de trânsito passam então a fazer somente blitz educativas. Não multam nem apreendem veículos irregulares até o dia da eleição. O senhor não acha isso estranho?
- Caro jornalista, o atual governo tem deixado a questão da segurança pública muito a dever. Gastou muito comprando carros e a violência só aumentando. A questão da segurança pública será uma máxima no meu governo, vou pavimentar todas as estradas estaduais e aumentar o salário dos policiais, pois quem faz a polícia é o policial, um ser humano, e o ser humano, no meu governo, será levado a sério.
-Candidato, o senhor entendeu minha pergunta?

Deu pra sacar?

Dessa maneira, para não dizer que os políticos cercaram tudo pelos quatro lados, deixaram passar a opção de votar em branco. Ah, Filipe, então tudo o que você está falando não tem sentido, eu posso votar em branco. (É, pode até ser que eu só fale merda - ainda bem que meus amigos me escutam. Ou não). Acontece que, não sei de onde saiu isso, a opção de votar em branco, aqui no Brasil é identificada como a possibilidade de estar jogando o voto fora. Por que depreciar tanto uma das alternativas de voto? Na propaganda eleitoral, a opção Branco é seguida de uma imagem de uma lixeira. Porra, se isso é uma democracia, como pode um veículo governamental denegrir tanto assim uma alternativa que, teoricamente, ele mesmo criou? Estranho isso.

Eu vou votar, tenho meus candidatos. Na real, eu me considero um cara com um nível razoável de politização – não vou ser hipócrita a ponto de dizer que não sei de nada, não amo as criancinhas. Me considero um cara que vai votar é com gosto mesmo, por afinidade ideológica. Aliás, me estranha muito uma pessoa me perguntar por que eu voto nos meus candidatos mesmo sabendo que eles não tem possibilidade de ganhar. De onde surgiu a idéia que só é bacana votar em quem está melhor nas pesquisas? Muito estranho. Enfim, mesmo sendo o voto obrigatório, vou votar.
Um dia desses, um amigo meu estava muito puto por que foi designado a ser mesário. Mal sabe ele que se eu pudesse, eu mesmo seria mesário. Eu acho cabana, ora porra. Eu quero saber de onde veio a idéia que participar da eleição é uma coisa de otário.

Gosto de horário político, sério mesmo.

O que acho foda é que existem pessoas que acham um saco votar e ter que fazer parte do processo. Não acho foda a pessoa. O que acho foda é ela ser obrigada a ter que ir contra a vontade dela. Isso é democracia? Então é muito justificável, portanto, a pessoa que se sentiu prejudicada pelo Estado, chegar à urna e votar em ex-humoristas, ex-jogadores e ex-garotas de programa só como revide, só pra fazer o mal, só pela putaria. Ela não está errada. Como não tem outra forma de lutar contra um sistema que a oprime, faz o que estiver à mão. Fazer o quê? Mas o Sistema ganha com isso também, porque essa galera é eleita e avilta (avacalha, mesmo) o congresso, faz no fundo é o eleitor desinteressado ficar mais indiferente ainda, não achando motivos para se interessar por política.

Brasil, infelizmente, ainda é um país condenado à esperança.

Como diria Lampião, momentos antes de ser assassinado:
-Não adianta, o sertão vai continuar o mesmo.

Escrevi demais. Porra. Será que alguém lerá todo? Se bem que acho que passei legal a idéia.